quinta-feira, 6 de julho de 2017

Poesia

Tudo ao meu redor é poesia
Rua, sol e ventania
Mas só você não via.

Em teu mundo só cabia
O que o dinheiro oferecia

Tudo ao seu redor é poema
As cores das flores
E o choro dos desamores

Em teu mundo só cabia
dormir á noite e trabalhar de dia

Tudo ao redor é encanto
A ferida que cicatriza
O sorriso após o pranto

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Vingança

Ela amou-o como nunca amara ninguém. Amava de um amor completo. Queria e não exigia. Dava e não cobrava. Esperou a vida toda por isso. Era paixão. Era tudo. Foram felizes. Até o dia em que num telefonema ele revelou que não largaria a esposa.

Ela chorou-o como nunca chorou por ninguém. Era em pedaços. Gritou. Chorou.

Inconformada, decidiu reivindicar o que o dera, ia vingar-se. Procurar a esposa. Sabia o endereço da casa, do trabalho, e até da mãe. Fazer escândalo no trabalho. Não, escândalo não. Ia quebrar o carro. Contratar marginais. Não, não conhecia marginais. Contaria tudo para a esposa. Mas aí ela vai querer o divórcio. E ele, pela culpa e remorso, vai querer o casamento. Ele vai se humilhar. Eles irão conversar. E logo estão em lua de mel. Não...a sombra da traição encoberta destrói mais do que qualquer verdade.

E decidiu deixar os dois juntos, entregues ao fardo matrimonial que os enlaçava, e também os enterrava. Imaginou os jantares mudos. a tv ligada para suportar a presença do outro. Ela, encontraria um novo amor. Ele, amargaria o cotidiano conjugal.

Sua vingança: deixar que a vida se encarregue dos próprios reveses.

Paris

Paris é sonho falido.
A vida que acaba,
como quem leva um tiro.

Paris é sonho enterrado,
Como alguém que deixa
sem ter começado.

Paris é sonho esquecido,
Como quem acorda
num dia de domingo.

Paris é sonho detido,
Como quem vive
num país fodido.


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Unilateral

Era uma cidade pacata e uma rua silenciosa, onde todos os vizinhos viviam em seus bunkers como se esperassem a invasão russa.

Assim morava Juli em sua casa-ilha em seu próprio tempo-espaço. É assim morar nas cidades. Era assim naquela cidade que não era sua.

Até o dia em que Juli ouviu ruídos e ritmos, ainda sem forma até se aproximar do muro para entender. E os sons vinham da casa ao lado, desabitada por 4 anos, habitada a uma semana. E os sons eram música. E aquilo era vizinho.

Juli reconheceu a música. Era uma velha canção de que já não ouvia a muito tempo, desde que havia se perdido de si mesma. Uma música que ouviu repetidas vezes, em tantas ocasiões de sua vida, mas que agora, era apenas a alegoria de um tempo que passou e de uma Juli que não existe mais, adolescente, patética, cheia de sonhos e sons. E esses mesmos sons, "Sweet child o mine", "Jeremy", "Enter Sandman", "Losing my religion" entre outras, eram agora passaportes para uma longa viagem.

Semana após semana, Juli aguardava as músicas do vizinho, talvez em seus momentos de folga. E acompanhava todas as músicas tocadas, ria, chorava, lembrava. Pelo muro, ia reportando-se a ela mesma, revisitava o passado e redescobria a si mesma. Cavava fundo em si, conforme os sons do passado vinham diretamente da casa ao lado.

 Ela imaginava que sentimentos também não haviam ali ao lado remexidos pelo som. Que memórias aquela pessoa também carregava. Não lhe importava saber se era "ele" ou "ela", engenheiro, arquiteta ou farmacêutico, nome ou rosto. Só sabia que era também um náufrago. Mas estabeleceu com aquela pessoa, uma relação unilateral de encontros marcados no muro, onde Juli encontrava-se com ela mesma.