Eram lentos aqueles dias de verão
O sol pesava em meu ombros
Tudo se arrastava
Amores lentos...
Tudo era ouro o que o sol beijava
Difundia em brilho o refino que virara
Tudo se arrastava
Os sons seguiam o silêncio
Daquelas tardes vazias
Em que o dia era eterno
Naqueles dias lentos de verão
quarta-feira, 5 de novembro de 2014
sábado, 25 de outubro de 2014
Fuga nº 2 ou Pássáro
Tuas penas bonitas, tecidas a mão
Empreste-me uma e voo com a imaginação
Tua liberdade, verdade, liberta mais que saudade.
Não te preocupas com o amanhã, pois tudo tens sem pedia a ninguém.
Penas bonitas, empreste-me tua liberdade
Eu quero voar bem longe
Pro alto da montanha, pra debaixo da cama.
Empreste-me uma e voo com a imaginação
Tua liberdade, verdade, liberta mais que saudade.
Não te preocupas com o amanhã, pois tudo tens sem pedia a ninguém.
Penas bonitas, empreste-me tua liberdade
Eu quero voar bem longe
Pro alto da montanha, pra debaixo da cama.
sexta-feira, 1 de agosto de 2014
Fuga nº1
Você não está em você
Você não está ali
Você voa
Você foge
Você perde
Finge paisagens
Finge ser alegria
Mente ser você
Você não está ali
Você voa
Você foge
Você perde
Finge paisagens
Finge ser alegria
Mente ser você
Foi amor
Foi amor quando te vi
E amor ainda agora
Foi amor quando fugi
E amor quando escolhi
Foi amor quando neguei
E era amor quando procurei
Foi amor quando esperei
E também quando me desesperei
É amor quando está perto
E é amor quando não está aqui
É amor porque amo
tua presença, tua ausência
teu nome.
teu nome.
quinta-feira, 29 de maio de 2014
Dezessete
Sem ar. Foi assim que ela ficou quando
leu aquelas palavras de confissão dele, tão esperadas, tão inesperadas. Não
sabia o porquê, assim como ainda não sabe. E é nesses momentos que todo o
conhecimento acumulado não é o suficiente para conhecer a si mesma. E entre “decifra-me ou devoro-te”, acabou por
devorada (sem metáforas). Mas dessa vez, em sua própria mitologia, onde a
esfinge não tinha nem 18 anos.
E para ela, não precisava de mais nada,
ele estava ali, diante dela. Estavam livres de qualquer julgamento, qualquer
suspeita, - embora o crime não tivesse acontecido ainda-. Sem máscaras, como
eles mesmos disseram, representando apenas o teatro da vida, a dança. Cumprindo
com seus papéis de macho e fêmea, que embora instintivos, necessitam de certo
ensaio, marcação e preparo. E quem está preparado? Despir-se das máscaras, dos
medos, dos fantasmas (sem ópera, porque nessa trilha só toca rock)... Essa, não
é, definitivamente, uma encenação fácil.
Então, embora as palavras fossem fáceis
de encenar – diz-se tudo ao contrário do que se quer e pronto – o corpo não
mentiria. Teria ele percebido? O respirar, o ruborizar, o olhar... Sim, do
contrário seria negar o óbvio. E apesar de seu relógio só marcar 17, seu desejo
já era meia-noite. Ele tentou ser educado, pediu “por favor”. Mas deu o bote. A
presa desarmada. Pronto, item acusatório executado.
Para ela, apesar do sim, ainda lhe
restava algumas máscaras. Tirá-las ou não? Conflito. Optou pelo não. O não é
sempre mais seguro, embora mais amargo. Elas ainda acabariam por cair mesmo...
Ele se foi. Mas durante horas, o perfume
dele continuava a agarrá-la, beijar-lhe o colo.
E todo aquele filme, ele e ela, se
repetia inúmeras vezes, uma espécie de Lagoa Azul no canal Globo, mas dessa vez
a tela não era a da TV. Aos poucos, o filme repetido foi ganhando um novo
roteiro, novo diretor, nova direção. Era hora de montar novas cenas, cenários,
objetos. O papel principal já tinha ator escalado.
E o novo filme começou: iniciando com um
drama, depois uma pornochanchada rememorando
a década de 70 (boa década), melodrama latino , e terminou no clima de um noir, crimes sem culpa e culpa sem crime – e mais perfume, dessa vez o
dele, do corpo dele, excitante -.
Agora na tela, o que passa é um road movie, porque tudo é uma viagem – e
afinal, eles sabiam que não passaria disso-.
(julho de 2012)
quarta-feira, 28 de maio de 2014
O Beco
Rio de Janeiro, 20 de
junho de 1896,20:50. – A chuva causa
estalidos agudos. Parecem metais caindo. Passos rápidos e secos. Luz amarela.
Iluminação precária nas ruas. A pressa causa surdez. Não ouvia nada a minha
volta. O melhor disfarce é misturar-se. Gestos naturais, sorrir e cumprimentar.
Queria ser invisível.
Cheguei em casa, minha
humilde casa, meu casebre, mofado e úmido. Abrigo de insetos, de vermes, meu abrigo.
Abrigo, obrigo, obrigado.
Apoio as chaves.
Procuro pela casa alguém que não existe. Faço por hábito. Ninguém. Só agora
estou em casa, após os rituais sistêmicos de chegada que me encadeiam. Acender
e pagar as luzes da casa, checar os cantos, averiguar se cada objeto está aonde
deixei ao sair. O ritual de entrada é apenas extensão do ritual de saída, o
qual inclui uma fotografia mental de todo o cenário.
Deito na cama,
estático. A lâmpada a menos de um metro e meio acima de mim. Poderia tocá-la.
Entrelaço as mãos sobre o peito. Fico esperando.
Pode acontecer a
qualquer momento, podem me encontrar.
_________________________________________________
Rio de Janeiro, 21 de junho de 1896. 21:10 –
Chego em casa. Apoio as chaves. Passei imperceptível pelas ruas. Ás vezes sou
invisível. Venci os olhares alheios, os murmúrios dos jovens fúteis, e
dominação territorial de homens empoleirados.
Faço o ritual de
entrada. Deito na cama ainda vestido e de sapatos. A lâmpada pendurada
balanceia.
Penso na noite de
ontem. O que foi que eu fiz?
___________________________________________________
Rio de Janeiro, 20 de
junho de 1896. 23:41 – A chuva causava estalidos agudos, pareciam metais,
tilintava. Ouvi passos rápidos e secos. A luz estava amarela em razão da
iluminação precária. Ainda ouvia os passos e formavam um conjunto harmonioso
com os meus. Olhei para trás e vi uma pessoa, sem formas claras por causa da
penumbra. Caminhei mais rápido e os passos me seguiam.
Não deveria ter entrado
naquela rua. Finji sentir-me segura e
ignorar a presença de quem me seguia. Apressei-me, mas foi em vão, ele me
acompanhava. Eu respirava ofegante, denunciando meu medo. Sentia meu sangue
pulsando, pulando. Pensei em pedir ajuda a alguém, mas o beco era vazio, nada,
ninguém. Queria gritar.
Senti uma mão me
segurando fortemente pelo braço. Não consegui me soltar por mais que tentasse,
e fui completamente dominada. Ele me puxou para o canto mais escuro.
Foi tudo muito confuso
e perturbador, não fui capaz de enxergar seu rosto. Não passava de uma imagem
disforme.
Empurrou-me contra a
parede, sussurrou algo inteligível, abafava minha boca com uma mão e
segurando-me firme, cortou meu pulso. Eu estava exausta pela adrenalina e pelo
medo. Sentia tudo girar a minha volta e o tempo parar. Senti o sangue escorrer,
quente e ralo.
Ainda sinto dificuldade
em descrever tudo o que houve. É como se todas as cenas não tivessem mais
sequencia.
Ele se ajoelhou. E
embora a escuridão e minha exaustão não me permitissem reconhecer seu rosto,
percebi seu olhar. Olhava-me fixamente. Ele se ajoelhou num ato de devoção, e
seu olhar continha alívio e um mister de desorientação. E nem sei a cor de seus
olhos.
Então senti sua boca em
meu pulso, em meu sangue. Eu já estava inteiramente perplexa. Ele sugou, sorveu
meu sangue, numa ferocidade, numa ternura. Atônita, quase desmaiei.
A partir daí não sou
capaz de descrever os fatos seguintes por simplesmente não ter clareza deles.
Mas ao que tudo indica, ele me deixou naquele beco e fui encontrada por pessoas
que me acudiram.
____________________________________________________
Rio de Janeiro, 21 de
junho de 1896. 21:32- A pedido da polícia e sob sua observação, pus-me no mesmo
local em que sofri o ataque ontem. Uma de tentativa de atrair o agressor.
Sinto que seria
impossível reconhecê-lo, parece-me agora que todos os estranhos tem a mesma
altura e tipo físico que o dele. Creio só poder reconhecer seu olhar e o toque
de seus lábios.
A busca policial hoje
foi em vão.
__________________________________________________
Rio de Janeiro, 25 de
junho de 1896. 19:57 – Sinto medo constante desde aquele dia. Sinto horror pela
sua covardia. Monstro!
Mas temos continuado
com as ações policiais.
___________________________________________________
Rio de Janeiro, 24 de
junho de 1896. 22:01 - Chego em casa. De
volta para ninguém. Não deveria nem ter saído. Apoio as chaves. Ritual de
chegada.
Finalmente chego em
casa, após cruzar as multidões pelas ruas, gostaria de ser invisível. Não
existo para elas, ninguém me percebe. Nem mesmo ela.
Hoje a vi. Estava na
mesma rua. Mas não estava sozinha. Percebi a armadilha policial.
Devo continuar minha
rotina.
Repasso todas as cenas
em minha cabeça, até sou capaz de sentir o seu gosto na boca. Aquele gosto
vermelho. Ansiedade.
Preciso evitá-la. Mas
não quero.
___________________________________________________
Rio de Janeiro, 26 de
junho de 1896. 17:12 - Hoje não terá
ação policial. A partir de hoje as investigações serão internas e ocultas. Não
há pistas. Só uma navalha que foi encontrada no local.
Meu corte cicatriza,
minha alma não. Mas já não tenho mais certeza se o culpo mais do que a mim
mesma, a minha incompetência, minha fragilidade. Exijo punição para ele porque
não posso punir-me. Quero ele sangrando. Quero ele sofrendo. Quero ele...
_____________________________________________________
Rio de Janeiro, 26 de
junho de 1896. 21:26 – Chego em casa. Apoio as chaves. Ritual. Ninguém me
espera.
O dia foi longo.
Sinto-me ansioso.
Passei pelo mesmo
local. Ela não estava lá. Queria vê-la. Graciosa, bonita, branca, macia.
Repasso todas as cenas em minha cabeça. Eu a imagino novamente. Imagino-me
ajoelhado, vertendo lágrimas, agradecendo seu sangue.
Ela não estava lá e nem
seus policiais. Preciso evitá-la, mas não consigo.
______________________________________________________
Rio de Janeiro, 27 de
junho de 1896. 18:34 - Hoje irei ao
local. Irei sozinha, não me importa. Preciso olhar nos olhos dele, só assim,
verei nele, a covardia que sinto em mim. Preciso reconhecê-lo. Não penso em
outra coisa. Que seja feita a Justiça!
_____________________________________________________
Rio de Janeiro, 27 de junho
de 1896. 22:13 – Chego em casa. Apoio as chaves. Ritual de chegada. Não há
ninguém.
Passei pelo mesmo
local. Ela estava lá. Ela estava sozinha, perdida, pálida. Procurava por algo
que desconhece. Nitidamente assustada. Frágil. Irresistivelmente frágil.
Passei por ela. Ela não
me reconheceu. Às vezes sou invisível. Mas ela me esperava.
Esperei. Esperei a hora
certa. Encurralei. Ataquei.
Senti-a novamente.
Empurrei-a contra a parede do beco escuro. Abafei sua boca. Ela estava furiosa.
Ela estava eufórica. Ela desmanchava-se. Arranquei o curativo de seu pulso.
Cortei-a novamente. Eu a cortei. Rasguei sua carne. Ela ameaçava, grunhia. Ela
sangrava e eu já não ouvia. Senti seu sangue, rápido e amargo. Olhávamos
fixamente. Beberia eternamente. Ela estava assustada. Eu em êxtase.
Sussurrei em seu
ouvido: Você gostou!
Larguei-a e fui embora.
Não olhei para trás.
Chego em casa e estou
com minha lâmpada cambaleante.
__________________________________________________
Rio de Janeiro, 28 de
junho de 1896. 13:23 – Cinismo, covardia e loucura. Esse é ele. A cada dia mais
sinto repúdia por ele. Mas também me repudio.
Todo meu corpo ainda
dói. Sinto sua violência. Sinto todo ele em mim.
__________________________________________________
Rio de Janeiro, 28 de
junho de 1896. 22:56 – Chego em casa. Ritual de chegada. Apoio as chaves.
Ninguém em casa.
Ela estava lá
novamente. Perdi minha invisibilidade. Segurei-a, arrasteia-a, domineia-a,
cortei-a, bebi-a.
Ela não resistia, não lutava. Ela estava lá.
Eu estava no céu.
Sussurrei: até amanhã!
__________________________________________________
Rio de Janeiro, 28 de
junho de 1896. 23:04 – Cinismo, covardia e loucura. Essa sou eu. Sinto-me parte
dele.
Até amanhã. Até todo
dia.
(algum mês de 2013)
(algum mês de 2013)
Inefável
Os mistérios são mais belos ainda encobertos
O eterno inefável...
Torna mais vivas as memórias
Lembranças da alma!
Cava mais fundo a cada dia
A armadilha que minha vida já anseava
Tramava meio escondida
E quando revelada,
vai seguindo perdida.
(abril de 2014)
Assinar:
Postagens (Atom)