quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Caos



O caos é um estado de espírito. O caos não é um acidente. O caos somos nós.

Esse caso aconteceu num lugar não muito distante daqui e não muito tempo atrás. Mas poderia ter acontecido em qualquer lugar, a todo tempo. Porque o que se passou, poderia ser com qualquer um. Poderia ser o padeiro que faz o nosso pão de cada dia, poderia ser a vizinha que você vê varrendo a calçada todas as manhãs, mas dessa vez foi com o arquiteto.

Ele entrou na delegacia, calmo, seguro. Tinha uma denuncia a fazer. Só podia ser com o próprio inspetor.

“Sinto desejo de gritar quando tudo está silencio. Sinto desejo de quebrar o que está inteiro. Quero desarrumar o que está em ordem. Quero provocar a discórdia. Quero causar um acidente. Destruir o que é bonito.

Para tudo o que olho, eu quero o caos. Em todos os lugares.

Certa vez eu estava dirigindo. Tudo harmonioso. Todos em direção. Isso me irritou profundamente. Desejei jogar meu carro contra outro. O que aconteceria? Eu teria morrido? Alguém sobreviveria? Qual seria o tamanho do estrago no meu carro? Imaginei aquela confusão de bombeiros, ambulância, jornal, polícia. Imaginei todos me perguntando o que teria acontecido. Um apagão mental no volante poderia ser fatal, ou um mini infarto. Todos me perguntando como eu me sentia. Queria saber como se passa por um acidente. O que é ser um sobrevivente.

Outro dia eu estava na sala de espera do dentista. Todos, de frente uns para os outros, mas ninguém se encarava. Ninguém quer olhar para um desconhecido. Um silencio total. Irritante. Quis gritar. Quis xingar aquele careca em seu ouvido. Dizer que somos todos patéticos. Que a vida é patética. Quis socar a cara de santa imaculada daquela velha que me olhava como se estivesse em um andar superior.  Imaginei os psiquiatras dizendo que sofro de uma síndrome, ou um transtorno momentâneo, um stress. Me recomendariam alguns calmantes e terapia.

No mercado, quando vejo todos aqueles produtos perfeitamente enfileirados, exibindo orgulhosos seus altos preços injustos para enriquecer um filhinho de papai, quis jogar tudo ao chão. Destruir cada palmito enlatado. Cada suco de caixinha. E acima de tudo, quis jogar longe, o mais longe possível aquela pizza congelada. Já estava imaginando os seguranças me agarrando, eu resistindo, sendo arrastado. Eu teria que explicar falsamente meus graves problemas financeiros e como isso tem afetado meu equilíbrio psico-social.

Quando vejo os gatinhos na rua...como reagiriam a um chute?

E quando sinto vontade de empurrar um desconhecido na frente de um carro.

Por isso estou aqui na delegacia, para pedir que me prendam. Não posso estar em sociedade.”


- Meu senhor, não podemos fazer nada, o senhor nada cometeu. Não há provas. Não é um criminoso.

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